segunda-feira, 30 de março de 2009

Livro das Horas

Miguel Torga

Aqui, diante de mim, 
Eu, pecador, me confesso 
De ser assim como sou. 
Me confesso o bom e o mau 
Que vão em leme da nau 
Nesta deriva em que vou. 

Me confesso 
Possesso 
Das virtudes teologais, 
Que são três, 
E dos pecados mortais 
Que são sete,
Quando a terra não repete
Que são mais.

Me confesso 
O dono das minhas horas. 
O das facadas cegas e raivosas 
E das ternuras lúcidas e mansas. 
E de ser de qualquer modo 
Andanças 
Do mesmo todo. 

Me confesso de ser charco 
E luar de charco, à mistura. 
De ser a corda do arco 
Que atira setas acima 
E abaixo da minha altura. 

Me confesso de ser tudo 
Que possa nascer em mim. 
De ter raízes no chão 
Desta minha condição. 
Me confesso de Abel e de Caim. 

Me confesso de ser Homem. 
De ser o anjo caído 
Do tal céu que Deus governa; 
De ser o monstro saído 
Do buraco mais fundo da caverna. 

Me confesso de ser eu. 
Eu, tal e qual como vim 
Para dizer que sou eu 
Aqui, diante de mim!

3 comentários:

  1. Falta Cecília Meireles aqui! Falta sim! rs Pra alavancar:

    Interlúdio - Cecília Meireles

    As palavras estão muito ditas
    e o mundo muito pensado.
    Fico ao teu lado.


    Não me digas que há futuro
    nem passado.
    Deixa o presente — claro muro
    sem coisas escritas.


    Deixa o presente. Não fales,
    Não me expliques o presente,
    pois é tudo demasiado.


    Em águas de eternamente,
    o cometa dos meus males
    afunda, desarvorado.


    Fico ao teu lado.

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  2. Só p avisar q estive por aqui, ah.. atualizei meu Blog, se puder visita lá, abs, bro!

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  3. Ai, ai...
    Por isso eles são reconhecidos e estudados
    Bem melhor do que qualquer um de nos já tentou ser.

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